ADILCIO CADORIN*
1839 - EM 15 DE NOVEMBRO A DERROTA DA REPUBLICA
CATARINENSE PROJETOU PARA O MUNDO A REPUBLICANA ANITA
GARIBALDI.
Proclamação da Republica Catarinense Pintura de Claudio Carpes |
Giuseppe Garibaldi - 1835 |
Padre Vicente - Presidente da República Catarinense |
Depois de proclamada a República,Catarinense, as divergências ocasionadas
entre o Governo Civil e as forças militares entraram em choque em virtude de que a tropa necessitava ser equipada e alimentada de forma urgente, o
que estava sendo suprido através de expropriações não muito democráticas, contrariando a formação
republicana do Padre Presidente e seu gabinete civil, além do que o gabinete e
seu presidente não respondiam com agilidade às autorizações e os meios que os militares necessitavam
receber para invadirem as demais cidades catarinenses que ainda estavam sob
domínio monárquico.
Premidos pela falta de víveres e de
equipamentos motivados pelo bloqueio naval, com o passar dos dias a Republica Catarinense definhou por falta
de atividades econômicas, o que motivou
Garibaldi a equipar três navios para abordar navios mercantes do Império
carregados com mercadorias. Após
conseguir enganar as naus imperiais que bloqueavam a saída do Porto, Garibaldi navegou
para o norte, onde após algumas
abordagens, apreendeu três navios e suas
cargas. Em sua companhia, estava Anita, que havia se recusado a esperar seu
retorno à Laguna. Já retornando, foram surpreendidos por algumas naus
imperiais, que os obrigou a ancorarem na enseada de Imbituba, onde, no dia 4 de novembro Anita teve seu Batismo de Fogo, ao receber um tiro de canhão que matou dois
soldados que estavam ao seu lado, tendo-a jogado à distância e a fez desmaiar. Garibaldi correu para socorre-la, e após recobrar
os sentidos, ordenou para que
ela se colocasse a salvo e fosse para o porão, enquanto a batalha acontecia, tendo Anita
respondido que iria sim, mas para buscar os covardes que lá se escondem da
luta, o que de fato fez, trazendo para cima alguns soldados, que
vendo-a corajosa e valente, dando vozes
de comando e de incitação à luta em plena batalha, dobraram suas energias até
que o comandante imperial foi atingido e o ataque cessou, permitindo que na
calada e na bruma da noite, os
navios republicanos pudessem saír da
Enseada sem serem vistos, regressando à Laguna.
Por ora, a República estava salva, mas a
reação do Império não tardaria. De fato, no dia 15 de novembro de 1839, a
Monarquia acionou sua frota de vinte e
dois navios e iniciou a maior batalha
naval de sua história em águas nacionais. Esperando serem atacados, Garibaldi
havia disposto seis navios em linha, ancorados ao longo do Canal da Barra, próximos ao Forte que havia construído e mais
1200 atiradores ao longo do lado sul do Canal. Após Garibaldi ter subido uma
das montanhas para do alto observar o
movimento das naus imperiais, o ataque foi desfechado, tendo Anita disparado o primeiro tiro de
canhão, já que ninguém ousou desobedecer o comando que proibia de dispararem
enquanto Garibaldi não estivesse
presente. Mas distante e impossibilitado de dar início à resistência, por
iniciativa própria, Anita deu fogo nos canhões, iniciando a batalha naval que,
embora tenha havido um longo combate com
muitos atos de heroísmo e de mortes a queima roupa, marcou a derrota e o final da República
Catarinense, obrigando Garibaldi atear fogo em seus próprios navios e abandonar
Laguna, mas não sem antes Anita salvar descarregando munições e pólvoras das
naus em chamas, transportando-as para terra em uma canoa, fazendo três viagens,
atravessando o fogo cruzado. Findava o dia 15 de novembro quando Anita,
Garibaldi, oficiais e soldados farroupilhas retiraram-se rumo sul, deixando para crepitar nas chamas de seus
barcos os sonhos republicanos de igualdade e justiça social. Estava encerrada a
República Catarinense, apenas 107 dias
após ter sido proclamada. Dos diversos movimentos e conflitos que foram deflagrados em
território brasileiro contra a monarquia
portuguesa e depois contra a monarquia brasileira, a República Catarinense foi
a derradeira tentativa, exatamente e coincidentemente
50 anos antes da República Brasileira ser proclamada. Ironicamente, foram os
militares brasileiros que ao longo dos anos, tanto no período do Brasil Colônia
como no período do Brasil Imperial, combateram as diversas insurgências republicanas, mantendo pelo direito da força o
regime monárquico, que somente foi
extinto em 15 de novembro de 1889, quando foi proclamada a República Brasileira pelos
militares, então liderados pelo Marechal Deodoro da Fonseca.
Anita em seu Batismo de Fogo |
1889
- 15 DE NOVEMBRO - A PROCLAMAÇÃO DA REPUBLICA
BRASILEIRA
O ato de proclamação da República aconteceu onde hoje está localizada a Praça
da República, no Rio de Janeiro,
que na época
era a capital do Império do Brasil, quando Deodoro da Fonseca, liderando um grupo de oficiais, depôs o imperador D. Pedro II, e assumiu o
poder no País e estabeleceu um governo provisório republicano, que se tornaria a Primeira República Brasileira.
Portanto, a República Presidencialista
Brasileira foi instituída através
de um golpe de
Estado, que
extinguiu o regime monárquico parlamentarista do Império Brasileiro, obrigando o
Imperador e a família real se exilarem na Europa. Dentre outros, três fatores foram determinantes para os acontecimentos de 15 de novembro:
Proclamação da República |
a-
Abolição
da Escravatura - Em 13 de maio de 1888,
a Princesa Isabel assinou a Lei Áurea,
libertando os escravos, mas desencadeou um
forte descontentamento nas elites agrárias tradicionais do país, que
para compensar os prejuízos com a quase paralisação do trabalho escravo,
reivindicavam do Império indenizações
proporcionais ao preço que haviam pago pelos escravos libertados pela Lei.
Como
não foram indenizados, os proprietários dos escravos aderiram ao movimento
republicano, que era até então inexpressivo, deixando de darem apoio político
ao Partido Liberal, que era a base de sustentação política do regime Imperial.
A história registra que os ex-proprietários de escravos aderiram à causa
republicana, não por ideal, mas como uma vingança contra a monarquia. Após a
assinatura da Lei Áurea, o Barão de Cotegipe
teria dito à Princesa Isabel: - A senhora acabou de redimir uma raça
e perder um trono !
Lei Áurea, com assinatura da Princesa Isabel |
b-
Dependência
Religiosa - Alguns anos antes, os bispos
de Olinda e de Belém do Pará resolveram
se indispor contra a submissão da Igreja Católica ao Império, fato que os impedia
de colocarem em prática as ordens do
Papa sem a prévia aprovação do Imperador. Os dois bispos havia decidido seguir
as orientações do Papa Pio IX que havia
determinado a exclusão dos maçons da igreja. E os maçons eram uma das bases de
sustentação da Monarquia. A bula papal não foi ratificada pelo Imperador, tendo
sido determinado a prisão dos bispos desobedientes, que algum tempo depois
foram perdoados e libertados, mas o fato gerou um forte desgaste político, já
que a Igreja Católica era fundamental à sobrevivência do regime monárquico;
c-
Descontentamento
do Exército - Os militares do exército estavam
descontentes com a proibição, imposta pela monarquia, pela qual os seus
oficiais não podiam manifestar-se na imprensa sem uma prévia autorização
do Ministro da Guerra. Os
oficiais sentiam-se desvalorizados pelo governo civil, com soldos muitos
baixos, com promoções muito difíceis de serem obtidas, prevalecendo critérios políticos
e não meritórios, sentindo-se desconsiderados, se comparados com a Marinha, que
recebia mais recursos e atenções.
Tais fatores catapultaram as
ideias republicanas a tal ponto que, no
ano que foi proclamada a República, em 1889, existiam 74 jornais e 237 clubes
republicanos em São Paulo,
Rio de
Janeiro e no Rio Grande do
Sul, províncias onde estavam concentrados os
principais apoios aos ideais republicanos. Políticos como Quintino Bocaiuva,
Benjamin Constant, Campos Sales, Prudente de Morais, Júlio de Castilhos, Assis
Brasil, entre outros, intensificavam a propaganda republicana. Como referido acima, o movimento de 15 de novembro de 1889 não foi o
primeiro a instituir o regime republicano no Brasil, embora tenha sido o único
efetivamente bem-sucedido. Até então, muitas revoltas e conflitos já haviam eclodido, embora todos
tenham sido sufocados pela força das armas da monarquia:
·
Em
1789, a conspiração denominada Inconfidência Mineira não buscava
apenas a independência, mas também a proclamação de
uma república na Capitania de Minas Gerais, seguida de uma
série de reformas políticas, econômicas e sociais, mas delatada a conspiração
contra a unidade da Coroa Portuguesa, seu principal líder, o alferes Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, foi enforcado, decapitado
e teve sua cabeça exposta por longo tempo, enquanto que os demais integrantes
da tentativa republicana foram banidos
do Brasil;
·
Em
1817, a Revolução Pernambucana foi o único
movimento separatista do período
colonial que ultrapassou a fase conspiratória e atingiu o
processo revolucionário de tomada do poder, com a constituição de um governo republicano,
embora provisório para Pernambuco, que durou 75 dias;
·
Em 1824, Pernambuco,
a Baia e outras províncias do Nordeste brasileiro criaram o
movimento independentista conhecido como Confederação do Equador, igualmente
republicano, considerado a principal reação contra a tendência absolutista e a
política centralizadora do governo de D. Pedro I, que contou com a marcante liderança
do Frei Joaquim do Amor Divino Rabelo –
o Frei Caneca, que ao final foi executado;
·
Em 20
de setembro de1835, após tentarem
mudar sem êxito o Presidente da
Província Riograndense, que lhes havia sido imposto pela Regência de D. Pedro
II, os riograndenses, liderados pelo Coronel do Exército Imperial, Bento Gonçalves da Silva e outros oficiais,
proclamaram a constituição da República Rio-Grandense, separada do
Império, sendo considerado o maior conflito republicano enfrentado pela Monarquia,
pois durou cerca de dez anos, sendo encerrado com a assinatura do Tratado do
Poncho Verde, que anistiou e reincorporou todos os oficiais revoltosos nas
fileiras do exército imperial;
General Bento Gonçalves da Silva |
·
Em 6 de novembro de
1837 aconteceu a Sabinada, revolta separatista que durou cerca de um ano na Bahia, e que tinha como líderes
o médico e jornalista Francisco Sabino e o advogado João Carneiro da
Silva, que pretendiam implantar a República Baiense, com duração até que o Imperador Dom Pedro
II alcançasse a maioridade.
· Em
1839, no dia 29 de julho foi proclamada a República Catarinense que, como vimos acima, teve
curta duração, sendo extinta em 15 de novembro de 1839, após os republicanos
terem sido derrotados em Laguna, na maior batalha naval que a Marinha
Brasileira participou em águas
territoriais nacionais. Foi o último evento armado que antecedeu a proclamação
da República Brasileira, em cuja batalha se destacou e projetou ao Mundo a emblemática figura da
lagunense Ana Maria de Jesus Ribeiro, depois conhecida como Anita Garibaldi, a Heroína
dos Dois Mundos, a Mãe da Pátria Italiana.
Se o
sistema republicano é o mais justo
porque liberta das tiranias e deve ser exercido pelo povo e para o povo, associado ao fato de que Anita Garibaldi é a
única mulher que se tem notícia histórica de ter lutado pela instituição de quatro
republicas: a República Catarinense, a
República Riograndense, a República Uruguaia e a República Romana, neste 15 de
novembro de 2019, quando comemoramos o 130º aniversário de instituição da
República Brasileira e pranteamos o 180º aniversário da derrocada da República
Catarinense, é nosso dever reverenciar -la como A Guerreira das Repúblicas e da Liberdade.
As diversas imagens de Anita Garibaldi |
*Advogado, historiador, membro do IHGSC - Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina e fundador do CulturAnita - Instituto Cultural Anita Garibaldi.
5 comentários:
Ter a oportunidade de participar de todo esse resgate histórico é incrível, emocionante . Gratidão por compartilhar conosco todo esse conhecimento e materiais que produzem viagens em nosso imaginário.
Abraço Sr. Cadorin.
Uma aula de grande sabedoria histórica.Parabéns pela magnifica matéria amigo Cadorin.
Obrigada Sr Adilcio Cadorin por nos cotar uma linda história de Laguna.
Grato por tua consideração, amigo Júlio Cancelier. Quanto ao barco que afundou próximo a foz do Rio Urussanga, hoje Praia do Campo Bom pertencente à cidade de Jaguaruna, não foi o Seival. Foi o Farroupilha, que tinha o próprio Garibaldi como seu comandante. Após o naufrágio, Garibaldi e os sobreviventes caminharam até a a Barra do Camacho, onde encontraram o Seival, o que sobreviveu à borrasca, que era comandado por John Grigs. Depois de assumir o comando dele, Garibaldi singrou com ele pelo interior do complexo lagunar e com apenas quarenta homens tomou a cidade de Laguna. Foi o Seival que inicialmente abrigou os primeiros encontros entre Garibaldi e Anita, enquanto ancorado junto à Barra de Laguna. Valeu?
Fico-te grato por teu comentário, amigo Bau, pois sei o quanto amas esta cidade de Laguna, sua história e seus vultos. Este teu sentimento é a mola propulsora do desenvolvimento cultural de uma cidade. Lamentavelmente uma grande parcela de lagunenses não conhece sua própria história... Continue assim!
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